terça-feira, 26 de junho de 2007

Roteiros de Aula - Aula 11 – Domínio Público Internacional

Não se pode confundir direito do mar com direito marítimo. Este regulamenta as atividades privadas da navegação, enquanto aquele faz a regulamentação jurídica do mar.
O direito do mar foi codificado na ordem internacional pela Convenção das Nações Unidas sobre o Direito do Mar de 1982, conhecida como Convenção de Montego Bay. Ela classifica as águas e mares internacionais em várias espécies:
a) águas interiores: para o Direito Internacional Público, são as águas que se encontram aquém da linha de base ou de partida do mar territorial, enquanto que geograficamente são as águas cercadas de terras por todos os lados. Pelo último conceito, as águas interiores só interessariam ao Direito Internacional Público se estivessem cercadas por terras de Estados diferentes. As águas interiores fazem parte do território nacional, onde o Estado exerce ilimitadamente sua soberania;
b) mar territorial: faixa de 12 milhas marítimas (Convenção de Montego Bay e art. 1.º da Lei n.º 8.617/93) a partir da costa do Estado, onde o Estado exerce sua soberania, inclusive no espaço aéreo correspondente, no leito e no subsolo desta faixa. No mar territorial, a soberania exercida pelo Estado é limitada pelo direito de passagem inocente, que permite que navios de outros Estados passem por tais águas com o objetivo de atravessá-las, sem penetrar nas águas interiores ou fazer escala em ancoradouro ou porto, sem que possam ser impedidas pelo Estado costeiro, desde que a passagem seja contínua a breve;
c) zona contígua: faixa de alto mar (ou seja, fora do território do Estado) que se inicia imediatamente após o limite do mar territorial e, em princípio de mesma largura, sobre a qual o Estado costeiro tem o direito de tomar as medidas de fiscalização (aduaneira, fiscal, sanitária, de imigração, de segurança e de conservação e exploração das riquezas animais e minerais) que julgar convenientes na defesa de seu território;
Estreitos são acidentes geográficos naturais que fazem comunicar dois mares entre si. A Convenção de Montego Bay reconhece o direito de passagem inocente nos estreitos.
Canais internacionais são vias artificiais de passagem e comunicação, criadas por meio do trabalho humano, que unem duas águas através do território de um Estado para facilitar a navegação entre dois mares. Tais canais estão, em princípio, sujeitos à exclusiva soberania do Estado em cujo território se encontram, não se lhes aplicando o direito de passagem inocente.
Estados Arquipélagos são Estados constituídos totalmente por um ou vários arquipélagos, podendo incluir outras ilhas. As águas arquipelágicas são aquelas compreendidas dentro de linhas retas que unam os pontos extremos das ilhas mais exteriores e dos recifes emergentes do arquipélago. Estas águas estão sujeitas ao direito de passagem inocente, podendo o Estado suspender este direito por razões de segurança.
Navio é toda construção humana destinada à navegação capaz de transportar pessoas ou coisas. O navio público está sujeito às leis do Estado de sua bandeira em qualquer lugar em que se encontre. O navio privado está sujeito às leis do Estado em cujas águas se encontre, estando sujeito às leis do Estado de sua bandeira quando se encontrar em alto mar.
A Zona Econômica Exclusiva é a área marítima situada entre o mar territorial e o limite máximo de 200 milhas marítimas contadas da mesma linha base do mar territorial, onde o Estado costeiro pode exercer sua soberania para fins de exploração e aproveitamento, conservação e gestão dos recursos naturais, vivos ou não vivos das águas sobrejacentes ao leito do mar, do leito do mar e seu subsolo. A Zona Econômica Exclusiva tem natureza jurídica sui generis, pois não se confunde com o alto mar nem com o mar territorial. Na Zona Econômica Exclusiva, terceiros Estados gozam das liberdades de navegação, sobrevôo e de colocação de cabos e ductos submarinos, alem de outros usos do mar internacionalmente lícitos.
Plataforma continental é a planície submersa adjacente à costa que se estende a determinada distância a partir da terra, a partir da qual o leito do mar baixa abruptamente para as grandes profundidades da região abissal (borda exterior da margem continental). Se a borda exterior da margem continental estiver localizada antes do limite de 200 milhas da costa, considerar-se-á que a plataforma continental vai até 200 milhas. Se estiver depois de 350 milhas, considerar-se-á que a plataforma continental vai até 350 milhas da costa. São exclusivos os direitos do Estado costeiro sobre sua plataforma, para fins de exploração e aproveitamento dos recursos naturais, não podendo quaisquer outros Estados exercer qualquer domínio sobre ela, não se impedindo, entretanto, que outros Estados utilizem a plataforma continental de um Estado para ali colocar cabos e dutos submarinos.
O leito do mar na região dos fundos marinhos é chamado pela Convenção de Montego Bay de Área, que é considerada um espaço internacional que não está sujeita à soberania territorial de qualquer Estado. Os recursos minerais da Área, que são abundantes, são considerados patrimônio comum da humanidade e não podem ser apropriados por qualquer Estado ou particular. A Área é administrada pela Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos, que regula as formas de exploração dos recursos da Área, de conformidade com as disposições da Convenção de Montego Bay.
Rios internacionais são aqueles que banham, simultânea ou sucessivamente, terras de dois ou mais Estados soberanos. O regime jurídico dos rios internacionais pode ser resumido na vedação a que um Estado ribeirinho cometa atos que possam prejudicar a utilização do rio internacional pelos outros Estados ribeirinhos.
O alto mar compreende todas as partes marinhas não incluídas na zona econômica exclusiva, no mar territorial ou nas águas interiores de um Estado, nem as águas arquipelágicas de um Estado Arquipélago. O alto mar não é res nullius, mas bem de uso comum da humanidade. Seu regime jurídico é norteado pelo princípio da liberdade do alto mar (obedecendo, claro, a disciplina das regras de Direito Internacional Público), incluindo a liberdade de navegação e sobrevôo, a liberdade de pesca (inclusive para os Estados sem litoral) e a liberdade de colocar cabos e dutos submarinos. Os Estados sem litoral têm assegurado, pela Convenção de Montego Bay, o acesso ao alto mar, devendo firmar acordos bilaterais com o Estado costeiro por onde precisará passar para acessar o mar (Estado de transito) visando regular a passagem. Os Estados têm o dever de tomar todas as providências para zelar pela segurança e licitude dos atos dos navios de sua bandeira, bem como exercer efetivamente sua jurisdição sobre eles. A Convenção de Montego Bay veda o tráfico de escravos em alto mar, bem como estabelece que os Estados deverão cooperar para reprimir o tráfico de entorpecentes no alto mar e as transmissões não autorizadas de rádio e televisão oriundas de alto mar.
Os Estados detêm todos os direitos de soberania sobre o espaço aéreo acima de seu território respectivo e de seu mar territorial. Não existe, relativamente ao espaço aéreo, o direito de passagem inocente, devendo ser a passagem pelo espaço aéreo de um Estado autorizada por este.
As aeronaves podem ser públicas ou privadas. As aeronaves privadas (incluídas aquelas de propriedade de um Estado, mas utilizadas para fins comerciais) estão sujeitas à jurisdição do Estado em cujo solo ou espaço aéreo se encontrem, estando sujeitas à jurisdição do Estado de sua nacionalidade (bandeira) caso se encontrem no espaço aéreo onde nenhum Estado exerce sua soberania (como, por exemplo, o correspondente ao alto mar e ao Pólo Norte). As aeronaves públicas estão sujeitas à jurisdição do Estado de sua nacionalidade onde quer que se encontrem. Cada aeronave só pode ter uma nacionalidade.
O espaço extra-atmosférico é objeto do Tratado sobre Princípios Reguladores das Atividades dos Estados na Exploração e Uso do Espaço Cósmico, inclusive a Lua, e demais Corpos Celestes, de 1967. Tal tratado coloca o espaço extra-atmosférico como bem de uso comum da humanidade (res communis), dispondo que todos os Estados podem utilizar e explorar livremente o espaço extra-atmosférico para fins pacíficos. Entretanto, segundo o mesmo tratado, o espaço extra-atmosférico, bem como a Lua e demais corpos celestes, não poderão ser objeto de apropriação por um Estado por qualquer meio.
Diversas teorias surgiram para tentar definir o limite entre o espaço aéreo e o espaço extra-atmosférico. Na prática, pode-se estabelecer como limite funcional do espaço aéreo nacional a altitude máxima alcançada pelas aeronaves modernas (37.650 metros pelo MIG-25 em 31 de agosto de 1977). Entretanto, países equatoriais, liderados pela Colômbia, entendem que a órbina geoestacionária (altitude em que os satélites artificiais localizam-se, sobre a linha do Equador), localizada a 35.871 km de altitude, faz parte de seu espaço aéreo (o Brasil participou da reunião em que tal entendimento foi firmado, mas não assinou a Ata Final). Esta tese, que visava reivindicar a estes Estados soberania sobre os satélites artificiais, encontrou fortes opositores, principalmente a antiga URSS, para os quais a órbita geoestacionária faz parte do espaço extra-atmosférico.

Roteiro baseado em sua maior parte em MAZZUOLI, Valério de Oliveira. Curso de Direito Internacional Público. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006. p. 438 - 477.

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